Colheita manual ou mecânica: quais as diferenças?
O processo de colheita das uvas, também denominado como vindima, antecede a produção de vinhos e pode ser realizado de duas formas distintas: por meio da colheita manual ou da colheita mecânica.
Neste texto, vamos apresentar ambos os métodos, assim como as características de cada um deles. Para conhecê-los, continue a leitura e confira, ao final, detalhes sobre a colheita noturna também.
Colheita manual
Como o próprio nome sugere, a colheita manual é realizada graças ao trabalho de pessoas que utilizam as próprias mãos ou materiais que são manuseados por elas, como facas e tesouras apropriadas para a função, para apanhar os cachos de uva que serão utilizados na produção de vinhos, mas também de sucos e outros destilados de uva.
Normalmente, quando há uso de algum desses itens, que podem ser elétricos ou não, eles são sanificados para impedir a passagem de bactérias ou vírus para as frutas ou até mesmo para os galhos das videiras.
Como funciona?
Durante a colheita em um pomar de uvas manualmente, o segredo principal é que o corte do pedúnculo, ou seja, da haste que sustenta o cacho de uva, deve ser feito rente aos ramos de produção, pois assim diminui-se as chances de perda de água. Além disso, deve-se segurar um chaco por vez e evitar tocar nas bagas (o fruto em si) a fim de preservar a cera natural que a uva contém e recobre sua superfície, denominada na botânica como pruína.
Em relação ao horário ideal para apanhar as uvas manualmente, recomenda-se pela manhã ou a noite. Outra forma de evitar a perda da água que se acumula nos cachos através de condições climáticas, como chuva e orvalho, mas também da irrigação sobrecopa.
Um fator curioso é que as uvas nunca são apanhadas se os cachos estiverem molhados, pois isso gera um ambiente favorável ao desenvolvimento de microrganismos.
Depois de colhidos, a tendência é que os frutos sejam acomodados um por um em caixas de colheita com formato e ventilação adequada, os contentores, distribuídas nas linhas de plantio. Deve-se formar apenas uma camada de cachos, mantendo o pedúnculo para cima visando evitar prejuízos às bagas e facilitar a retirada na casa de embalagem.
Até lá, a recomendação é manter as caixas em uma área com sombra, e evitar que o tempo entre a colheita e o transporte seja longo.
Também é primordial que esses recipientes estejam sanificados e, de acordo com a Embrapa, “caso apresentem aberturas laterais, devem ser forradas com espuma de polietileno de 1 cm de espessura, plástico polibolha ou outro material flexível, macio e lavável”.
Onde a colheita manual é aplicada?
A colheita manual é comumente utilizada em locais onde há algum tipo de impedimento tipográfico na utilização de maquinários, como é o caso de terrenos com relevo.
Por isso, está presente no processo de produção de vinhos mais finos, como os da região do Vale do Douro e Champagne.
No caso de uvas de mesa que tem como finalidade o consumo in natura, recomenda-se também a colheita manual, já que essa técnica preza pela seletividade, podendo escolher os bagos em função de tamanho, formato, cor, textura, entre outras características.
Vantagens e obstáculos
Entre os benefícios desfrutados pelas vinícolas que optam pela colheita manual, está o fato do método permitir uma seleção minuciosa das uvas, garantindo, por exemplo, a separação entre o engaço (parte lenhosa do cacho) e o fruto.
Os danos às bagas também são pequenos, prezando por uma seleção individual dos cachos e descartando as uvas não saudáveis. Além disso, são necessários poucos equipamentos: facas, tesouras e cestos para o depósito.
E por ser uma prática tradicional feita por pessoas, representa também um momento não só de trabalho, mas de convívio. Por isso é tão popular em cooperativas que prezam por um ambiente mais familiar e que possuem hectares reduzidos.
No entanto, entre os obstáculos deste método está o alto custo e a falta de mão de obra qualificada, já que a demanda é sazonal e de ano em ano.
Colheita mecânica
Já no caso da colheita mecânica, todo o trabalho é realizado com base na tecnologia desenvolvida para a criação de maquinários que fazem a colheita de uva — alternativa que se tornou necessária graças ao aumento dos hectares de vinhas ao redor do mundo.
Como funciona?
Utilizando-se de uma tecnologia de sucção, os maquinários permitem a seleção dos frutos com a consistência correta e colaboram com a qualidade do produto final. Para isso, as colhedoras passam por cima das videiras plantadas com base no sistema de condução denominado espaldeira, no qual a distância entre as fileiras e a altura são pré-estabelecidas, o que pode variar conforme a casta de uva e a fertilidade do solo.
A colhedora mais famosa é a do tipo espaldeira e possui cinco mecanismos de funcionamento. São eles:
- Hastes sacudidoras: responsáveis por desprender as bagas dos cachos; são fixadas em cilindros, que giram e desprendem as bagas dos cachos;
- Hastes aparadoras: possuem a função de impedir que as bagas caiam no chão, conduzindo-as soltas para o sistema de transporte até que alcancem os reservatórios de uvas;
- Reservatório de bagas: armazena os produtos colhidos;
- Sopradores: têm a função de retirar o material mais leve que as uvas, como folhas e partes que se desprenderam das plantas (galhos, etc).
- Hastes vibratórias: presentes em algumas colhedoras, também ajudam a retirar impurezas.
Há ainda outro formato de maquinário, a chamada colhedora latada, similar a do sistema em espaldeira. A diferença é que a latada não precisa de um sistema de hastes aparadoras, já que as vagas caem diretamente sobre a esteira transportadora que as direciona para um reservatório, sem riscos de cair no solo.
Onde a colheita mecânica é aplicada?
A colheita mecanizada é ideal para o apanho de uvas destinadas à fabricação de vinhos e derivados.
O uso teve início na Califórnia, nos anos 1960. Dez anos depois, foi a vez da Europa, fomentada pela crise do petróleo, aderir ao método, especialmente na França. A técnica chegaria na Espanha só 20 depois, em 1990.
No Brasil, foi apenas em 2010 que a colheita mecânica foi introduzida no país, com o trabalho da vinícola Almadén, do Grupo Miolo, localizada no município de Santana do Livramento, Rio Grande do Sul. Na época, a empresa contava com uma máquina do tipo de arrasto (acoplada a um trator).
Vantagens e obstáculos
Os maquinários responsáveis por apanhar as uvas representam mais economia ao setor vinícola e sanam a questão da falta de mão de obra, ao mesmo passo que são mais ágeis, satisfazendo às necessidades de grandes produtores.
Para se ter ideia, uma máquina pode apanhar um hectare de vinha em cerca de uma hora e meia. No mesmo terreno, seriam necessárias, mais ou menos, 25 pessoas para trabalhar durante oito horas.
No entanto, também há obstáculos neste modelo, como é o caso da falta de especialistas para realização de manutenção periódica e o alto custo de aquisição, o que também se estende para as peças, que costumam ser importadas, além da menor qualidade na seleção das bagas.
Bônus: colheita noturna
Diferentemente do que muitas pessoas pensam, a vindima não é realizada apenas à luz do dia. Em alguns casos, é necessário aplicar a colheita noturna. Mas por que? O motivo está na temperatura.
Em algumas regiões, especialmente as de calor intenso durante o dia, colher as uvas nessas condições pode interferir diretamente nas castas, seja nos sabores, nas peles ou até mesmo nas polpas. A solução encontrada foi colher em um período que as temperaturas diminuíssem, ou seja, de madrugada.
Ao fazer isso, preserva-se na uva uma acidez mais alta, minimiza-se a extração fenólica das peles e mantém-se a fermentação sob controle, impedindo que o fruto “cozinhe” durante a exposição ao calor do sol.
Para a vinícola produtora, também há benefícios, como é o caso da diminuição no consumo de energia elétrica, já que as uvas chegam mais firmes, sem a necessidade de serem resfriadas.
A prática é bem popular na Califórnia, na Austrália, nos Estados Unidos, mas também nas regiões de Provence e Borgonha, na França, para a produção de brancos e rosés. Aqui no Brasil, uma das praticantes do método também é a Miolo, que realiza a colheita da casta sauvignon blanc durante o período noturno.
A escolha sempre vai depender da topografia do terreno, do tipo de produto que se deseja obter, do nível socioeconômico dos agricultores e da disponibilidade de mão de obra. Portanto, cabe a cada produtor a decisão final.
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Flávia
Sommelier internacional pela FISAR/UCS, pós-graduada em Marketing e Negócios do Vinho pela ESPM. Há 10 anos atuando no mercado e através de diversos canais de mídia especializados no mundo do vinho. Propago conhecimento para enófilos e amantes da bebida. Falar sobre vinhos é um prazer!